Sobre os órgãos de tubos - IV

Por Júlio Amstalden

O texto de hoje é dedicado a Henrique Lins, que tive o prazer de conhecer alguns anos antes de seu falecimento.

Henrique Lins nasceu em 1906 na cidade de Bocholdt, Alemanha, na região fronteiriça à Holanda. Ingressou como seminarista na Ordem de São Bento e na condição de noviço foi transferido ao Brasil em 1924, quando tinha então 18 anos. Fora enviado para Indaiatuba-SP, mais exatamente para a Colônia Helvetia, para auxiliar o pároco local, D. Ildefonso Stehle, o.s.b.

Helvetia era uma comunidade rural formada por imigrantes suíços do cantão de Obwalden, surgida em 1888 a partir de uma fazenda falida devido à abolição da escravatura. Uma vez instalados, os colonos tomaram duas providências: erigir a escola e a igreja, centros da vida comunitária. Os suíços produziam leite e derivados, bem como cultivavam frutas, de modo que sua produção era vendida nos mercados de Campinas e Indaiatuba.

Eram três as línguas faladas em Helvetia. A mais praticada era o Schwitzdutch (dialeto suíço), o Hochdeutsch (alemão erudito) era ensinado na escola  e o Português era usado para o relacionamento com os brasileiros. As professoras da escola eram freiras beneditinas alemãs, bem como o pároco era também alemão e beneditino. Foi dentro desse contexto que decidiu-se que a capela de Helvetia seria provida de um pequeno órgão de tubos proveniente da Alemanha, construído pela firma Gebruder Stehle (Irmãos Stehle). Supõe-se que o pároco da colônia tivesse relações de parentesco com os organeiros, dado que possuíam o mesmo sobrenome.

Lins chega a Helvetia junto com o órgão, que estava sendo montado na pequena galeria da capela. Segundo o próprio Lins, dificuldades estavam sendo encontradas nos trabalhos de montagem, pois as pequenas dimensões do instrumento dificultavam que se entrasse em seu interior para que se fizesse as conexões de muitos e pequenos dutos de vento. Lins era bem magro, de modo que automaticamente foi cooptado para o serviço. Esse contato com o órgão foi, para ele, determinante.

Seu encantamento com o órgão o motivou a pedir à família, que permanecera na Alemanha, livros sobre o assunto. Começo, então, de forma autodidata, a aprender organaria. Um pouco mais velho, decide deixar a ordem beneditina e permanecer no Brasil. Casou-se com uma moradora de Helvetia e passou a trabalhar com marcenaria, bem como a aventurar-se na organaria, instalando sua oficina em Indaiatuba. Construiu seu primeiro órgão para a Igreja Luterana de Friburgo, colônia alemã bem próxima a Helvetia. A partir desse instrumento construiu outros 29, em sua maioria destinados a igrejas do interior de São Paulo, existindo apenas um na capital. Lins construiu também um órgão para a Matriz de Formiga-MG, que há alguns anos atrás foi vendido para a UFPR, em Curitiba.

É interessante observar-se que os órgãos que Henrique Lins construiu eram, em geral, pequenos instrumentos, todos de dimensões e estrutura semelhantes ao da capela de Helvetia.

Desgostoso com os rumos que a música na Igreja estava tomando e percebendo o desinteresse pelos órgãos, Lins fechou sua oficina entre o final dos anos 60 e início dos anos 70, após o que passou duramente a procurar outras formas de subsistência para si e para a família.

Órgão Lins da Igreja N.Sra. da Candelária, São Paulo. Este instrumento foi construído no altar.

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