O Canto Coral e a Educação Musical -I



por Júlio Amstalden

Houve um tempo em que muitas pessoas tinham contato com a música através do canto em conjunto. No Brasil, as Igrejas eram os principais centros difusores dessa prática, desde o simples canto comunitário até o canto trabalhado, em quatro vozes mistas. Era no serviço religioso que se ouvia música e se conhecia repertórios, bem como era na comunidade religiosa que se era possível integrar um coro. Clérigos estrangeiros, oriundos de países onde o canto coral era uma prática muito disseminada, chegavam ao Brasil trazendo muito entusiasmo de intensificar esse costume por aqui. Era o caso de frei Pedro Sinzig, franciscano alemão radicado em Petrópolis, que muito fez pelo canto coral litúrgico no país.

Inicia-se, no século XX, um movimento de canto coral nas escolas públicas brasileiras, o chamado "Canto Orfeônico". Naquela época, Música era uma disciplina curricular levada muito à sério, cujo ensino era baseado na teoria e na prática, esta sendo realizada através da prática de canto em conjunto, a vozes mistas e iguais. O precursor desse movimento foi Fabiano Lozano, músico espanhol que imigrara com sua família para o Brasil, onde radicou-se na cidade paulista de Piracicaba. Foi nessa cidade onde deu início ao movimento de Canto Orfeônico, na Escola Normal "Prof. Sud Menucci", uma das primeiras escolas públicas do Estado Novo, fundada ainda em fins do século XIX. Lozano transfere-se para São Paulo, onde continuou seu trabalho como educador musical. Posteriormente, na década de 1950, na era Vargas, o compositor Heitor Villa-Lobos apropriou-se do movimento iniciado por Lozano e, por ser muito mais conhecido do que este, acabou sendo erroneamente considerado o pai do movimento no Brasil.

A escola pública brasileira sofreu uma profunda deterioração a partir da década de 1970, pois a ditadura militar estabelecida a partir de 1964 destruiu tristemente os currículos estabelecidos anteriormente, enfraquecendo-os e mutilando-os. Foi dessa forma que Música deixou de ser uma disciplina curricular e gerações de estudantes passaram a não ter mais contato com essa forma de conhecimento, de modo que tiveram como alternativa quase que unicamente a produção musical veiculada pelos meios de comunicação de massa. A música midiática nunca teve preocupações educativas ou formativas, pois sempre visou apenas o consumo.

Tal como escrito em artigo anterior, leituras equivocadas das orientações litúrgicas do Vaticano II (1962-1965) levaram os coros litúrgicos católicos à extinção. A música das missas também passou a ser cada vez mais influenciada pelo que a mídia estava produzindo e divulgando, de modo que uma autêntica participação popular e toda uma riqueza de muitos séculos passou a ser cada vez mais esquecida e substituída por uma grande pobreza de conteúdos.

Esse relato histórico muito breve ajuda a entender porque o canto coral no Brasil de hoje não é muito conhecido e difundido, principalmente entre os jovens. Em relação à Igreja Católica, parece que finalmente percebeu-se a necessidade de cuidar-se mais da música e de manter-se critérios para a sua prática litúrgica. Dessa maneira, timidamente os coros vêm tentando se firmar novamente nesse cenário.

Período tão grande de ausência não poderia fazer outra coisa a não ser deixar grandes sequelas. Em artigo posterior comentaremos sobre essas conseqüências e um possível caminho de reconstrução, oferecido pelas possibilidades do que conhecemos hoje por Educação Não Formal.
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